Está tramitando no Senado o projeto de lei 224 de 2012, do Senador Cristovam Buarque, que estabelece que o estudante beneficiário de bolsa de estudos custeada com recursos públicos federais fica obrigado a prestar serviços de divulgação, formação e informação científicas e educacionais, de no mínimo quatro horas semanais, em estabelecimentos públicos de educação básica.
A forma de participação dos bolsistas deve ser definida por órgãos federais competentes em conjunto com as secretarias estaduais e municipais de educação. Além disso, os bolsistas que forem para intercâmbio no exterior, recebendo bolsa do governo, deverão cumprir o serviço após o retorno ao Brasil, durante período igual ao que durou a bolsa. Isto é, os alunos que saírem do país pelo Programa Ciência sem Fronteiras ou outros programas de intercâmbio (se eles ainda existirem até lá), também deverão cumprir as quatro horas semanais na educação básica quando retornarem.
A justificativa para a proposta do Senador é que a participação dos bolsistas no ensino básico, ajudando a disseminar o interesse dos jovens estudantes pelas ciências, seja uma contrapartida ao benefício recebido pelos bolsistas.
Gostaria de convidar agora o leitor para uma reflexão sobre o que significa esse projeto de lei na vida de um aluno universitário. O que um aluno universitário faz? Certamente, a resposta todos sabem, ele estuda. Mas alguns vão além e dizem que ele somente estuda, como se estudar e se formar para ser um profissional fosse algo muito simples. Na verdade não é, e se em algum lugar isso está ocorrendo é porque a universidade na qual ele estuda não forma bons profissionais. A carga horária que um bom aluno universitário se dedica à sua formação é, em geral, elevada. O tempo que um aluno se dedica à universidade não pode ser contado apenas pelo tempo em sala de aula, mas também deve ser levado em conta o tempo que ele estuda fora da sala de aula, o tempo que leva para fazer estágio, o tempo que se dedica à iniciação científica, o tempo que se dedica às atividades de extensão, o tempo que se dedica à monitoria etc. Se todas essas cargas horárias forem consideradas, certamente veremos que atribuir mais carga aos alunos significará reduzir o tempo que ele tem para fazer sua atividade principal que é estudar e se preparar para ser um bom profissional.
Outra questão importante de ser analisada é a ideia de contrapartida. Um estudante de iniciação científica (IC), por exemplo. com bolsa do CNPq ganha mensalmente R$ 400,00, que serve como uma ajuda de custo, ou seja, o aluno normalmente usa a bolsa para transporte e alimentação somente (até porque R$ 400,00 mal dá para isso). E o que faz o aluno de IC? Ele auxilia um professor em sua pesquisa científica, ajuda na elaboração de experimentos, faz simulações, ajuda a analisar resultados etc. Logo, ele trabalha e recebe por esse trabalho R$ 400,00. Então, por que ele deve ainda ter uma contrapartida por receber bolsa? Não me parece razoável esse raciocínio, a não ser que se pense que o aluno não faz nada. E por que não utilizarmos então esse mesmo raciocínio em todos os servidores públicos, principalmente aqueles que ganham bem mais do que R$ 400,00?
Com os valores das bolsas extremamente baixos e a alta carga horária já imposta aos alunos, esse projeto de lei fará somente com que bons alunos, que queiram se dedicar mais aos seus estudos, abram mão de receber bolsa e sejam desestimulados a fazer diversas atividades importantes para sua formação. Se a ideia é aumentar a participação dos alunos em projetos de extensão, então por que não aumentar o número de bolsas de extensão, ou criar mecanismos que atraiam os alunos voluntariamente para desenvolverem essa atividade? Outra sugestão é investir no próprio professor da educação básica, qualificando-o melhor e incentivando-o a levar para as escolas aquilo que aprendeu na universidade.
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